terça-feira, 7 de dezembro de 2004

Unha, futebol e sarna pra se coçar


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Sábado joguei bola ébrio e minha unha ficou marrom de barro. Unhas marrons me fazem lembrar de Jiddu Krishnamurti. Tudo começou quando há uns dois anos eu estava vendo um filme meio ruim chamado The Hurricane (1999), aquele em que o Denzel Washington interpreta um boxeador preso injustamente no auge da carreira (eu achei justo, o Denzel W. devia ser sempre preso). Em uma parte do filme o personagem lê um livro na cela e, durante cerca de meio segundo, quando ele fecha o livro, é mostrado o título e o autor do livro: The Awakening of Intelligence, de J. Krishnamurti. Claro que eu tive que pausar o filme pra ver o nome do negócio, não sou uma ave de rapina.
Cheguei a pensar que era uma coisa meio Hare Krishna, mas aí vi na internet que não tinha nada a ver. Li alguns sites relacionados e fiquei empolgado, comprei até um livro dele: Commentaries on Living (Diálogos Sobre a Vida). Um ano depois, comprei mais um, The First and Last Freedom (A Primeira e Última Liberdade), esse com prefácio do Aldous Huxley. Mas aí parei de comprar, ficou enjoativo, talvez por ele não ser SÓ escritor e ter boa parte de sua obra transcrita de gravações de palestras e conversas; fora o fator simplicidade, ou seja, ele não rebusca o vocabulário, só nos fornece o feijão com arroz - é tudo muito homogêneo. Isso é ruim.
Quanto à relação entre ele e minha unha marrom de barro, explico: um dos aspectos de sua filosofia consiste em mostrar essa falta de consideração pela natureza que tem o homem, mormente na vida virtual de hoje. Pergunta primeira: "Ah meu Deus, ele é um guru-hippie?". Resposta: eu já vi um hippie na Av. Paulista vendendo um livro dele e se isso tem ligação, não sei .
Só para resumir, a minha interpretação bem simplificada da obra dele é a seguinte: o ser humano arruma muita sarna pra se coçar e depois não consegue se livrar da sarna. Até esquece que tem a sarna ou fica se coçando, achando que é natural tê-la. Aí surge a pergunta segunda: "É auto-ajuda?". Não, garanto que não. A essência da auto-ajuda é dar respostas, ao passo que o alicerce do pensamento dele é evitar as respostas, soluções, e incitar as perguntas - muitas perguntas. Aliás, algumas dessas perguntas mexeram com o brio da banda Live, que pariu o álbum Mental Jewelry (1991) - na minha opinião, um PUTA álbum - em homenagem ao indiano, que morreu em 86. Se bem que foi uma das poucas coisas decentes que essa banda fez na carreira inteira. Um trecho de Diálogos Sobre a Vida, pra finalizar:
"Ignorância é uma coisa, e o "estado de não saber" outra coisa muito diferente; as duas nenhuma relação tem entre si. Uma pessoa pode ser muito ilustrada, muito hábil, muito eficiente e talentosa e, apesar disso, ser ingorante. Há ignorância quando não existe autoconhecimento. O homem ignorante é aquele que não se conhece, que não conhece suas próprias ilusões, vaidades, invejas, etc. Autoconhecimento é liberdade. Pode um homem conhecer todas as maravilhas da terra e do céu e, contudo, não estar livre da inveja, aflição. Aprender não é acumular sejam conhecimentos, sejam coisas ou relações. Ser inteligente é ser simples - mas ser simples é extremamente difícil".

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