segunda-feira, 13 de dezembro de 2004

Fuga

Trocando em miúdos, tudo o que Sartre queria dizer é que o homem não sabe o que fazer com a liberdade. Tem até aquela frase: "Estou condenado a ser livre". Pois então eu digo: os ladrões de faroeste eram felizes. Um ladrão no estilo Butch Cassidy & The Sundance Kid (aquele filme de 69 que tem a música Raindrops Keep Falling on My Head ), ah, esse era feliz viu.
Fugir de xerifes com poeira na boca, um piolho-de-cobra morto no bolso, uma cicatriz no ombro, outra no calcanhar e uma marca de picada de serpente no joelho, era bom sim. Ao meu lado, o comparsa de roubos e meu cavalo esturrando de sede, fome e cansaço, mas leais como sempre. Na hora de dormir, com o despertar da solidão, lembraria da morena de olho bonito esperando lá pelas bandas de Oklahoma, longe, muito longe, de vestido branco. Enquanto isso, um surinamês perdido passa por entre as frestas de um canyon estreito lá embaixo, com sua mula, cantando uma música boliviana em tom desafinado, entre um e outro cuspe.
A vida sob pressão faz as coisas se desenrolarem com mais esplendor, mais beleza. A ditadura abrolhou diversas obras-primas; uma mulher adora ser prensada na parede; um time carioca sempre ganha faltando uma rodada pra se definir quem é rebaixado; um baterista sempre toca melhor com um estádio lotado; um cão sempre fica mais afoito quando está encoleirado; uma mãe, quanto mais repreender seu filho, mais serelepe deixa o muleque. Muita liberdade me faz mal, vou pegar uma espingarda e ir roubar cavalos em Minas Gerais.

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