domingo, 31 de outubro de 2004

Fargo


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Ontem vi um filme que me deixou nervoso em seu início: Fargo (1996), dos inquestionáveis Irmãos Coen. Eu odeio filmes que tem neve, especialmente aqueles em que é dada muita importância a ela. Talvez seja porque eu nunca vi ou senti a neve, e tudo que é palpável é mais admirável.

Mas com o desenrolar da história, cheguei à conclusão de que o filme não seria o que é sem a neve. Ela inspira e embeleza a frieza dos personagens, a frieza das cenas, talvez até camuflando a atrocidade com que tudo é feito. Os personagens sangrando, tropeçando no próprio descontrole que causa aquele chão mole. Outra coisa: neve combina com sangue e se engana quem acha que ela realça a vermelhidão dele pelo fato de ser branca. Ela ameniza, esfria, deixa o sangue menos assustador, mais gélido e inofensivo.

O mais intrigante é o fato de ser sempre ela o maior empecilho, talvez o único, para os personagens realizarem com total frieza os atos mais bizarros e bárbaros que um ser humano pode cometer. Veja bem, é a neve, e não qualquer tipo de barreira psicológica ou valor pessoal. O mesmo seqüestrador que fica espantado e indignado ao ver na novela uma mulher declarar ao amado que está grávida, não hesita em triturar (repito, triturar) seu companheiro de seqüestro. Tudo é feito com a mais pura e plácida impassibilidade.
Todavia, por incrível que pareça, são justamente essas cenas as mais cômicas e hilárias. Eu não conseguia parar de rir quando vi só o pé do sujeito pra fora do triturador ou quando um dos seqüestradores leva um tiro de raspão no maxilar; cheguei a duvidar do meu caráter nessa hora.
Obviamente coisas como essas não são engraçadas, mas o modo com que tudo se sucede é jocoso demais, caçoa do ser humano. O personagem interpretado por William H. Macy é o retrato do ridículo, do completo idiota, que troca a própria mulher por dinheiro (ele forja o seqüestro da mulher para tirar o dinheiro do sogro), enquanto seu filho troca a janta pelo Mc Donald's. Os seqüestradores, responsáveis pelo derramamento de sangue do filme, são extremamente burros, imbecis.

Já no fim do filme, enquanto via a policial grávida de 7 meses (papel que fez Frances McDormand levar o Oscar de melhor atriz) dando um sermão no seqüestrador completamente alienado (outra cena bem sarcástica do filme), concluí que a frieza pode não determinar a escassez de virtudes no ser humano, mas que ela é muito patética, ah meu amigo, isso é. Os personagens caem tombos muito engraçados na neve.

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